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Rádio Costa Oeste
A decisão do governo paranaense de autorizar a semeadura de soja até 14 de janeiro, duas semanas além do limite do calendário oficial, foi tomada sem ouvir pesquisadores especializados e poderá favorecer a resistência das doenças num período em que as condições climáticas não colaboram para o desenvolvimento das plantas.
A crítica está em nota assinada pela Associação Nacional de Defesa Vegetal (ANDEF), pelo Comitê de Ação à Resistência de Fungicidas (FRAC-BR) e pelo Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (SINDIVEG).
No dia 20 de dezembro, a Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar) emitiu a Portaria 345, que autorizou, em caráter excepcional para a safra 2017/2018, a semeadura da soja até a data de 14 de janeiro de 2018, em todo o Paraná, para cultivos em sucessão às culturas de milho ou feijão. Para o diretor presidente da Adapar, Inácio Kroetz, a extensão do prazo não traria riscos, por estar dentro de uma margem de segurança adequada.
“A medida é excepcional e vale apenas para esta safra. Tivemos uma variação de clima muito grande em setembro, com seca prolongada e depois chuvas, o que atrasou a cultura do milho, do feijão e da soja. Isso impacta no desenvolvimento das lavouras”, argumentou Kroetz. Como a previsão era de dias chuvosos no final de dezembro – o que acabou se confirmando – a Adapar entendeu que muitos produtores não conseguiriam fazer o plantio, por isso a agência “achou justo avisar antes”.
Em que pesem as boas intenções da Adapar, a indústria de defensivos reprovou a medida. Quanto maior for a janela de semeadura e o número de gerações do fungo da ferrugem asiática – diz a ANDEF – maior será a resistência ao modo de ação dos fungicidas. “Não entramos no mérito do prejuízo do produtor paranaense se não tiver a extensão da janela de plantio. Do ponto de vista fitossanitário a medida não é boa, porque a soja continua viva no campo e faz com que o fungo fique vivo e tenha mais condições de adquirir resistência. Para conseguir controlar o fungo da ferrugem da soja, é preciso proteger o fungicida. É como um antibiótico no hospital, você precisa tomar outras medidas para que o remédio possa controlar a bactéria pelo maior tempo possível”, avalia Roberto Sant’Anna, gerente de inovação e sustentabilidade da ANDEF.
Sant’Anna lamenta que a calendarização do plantio de soja seja feita pelos estados. “Infelizmente, os estados têm autonomia para definir o período. A ferrugem da soja é um problema sério, que ultrapassa os limites do Paraná e chega aos limites da América Latina. É preciso calendarizar e controlar os limites do vazio sanitário em todo o continente, porque se tiver soja plantada tardiamente na Bolívia ou no Paraguai, ela pode vir e contaminar nossas lavouras”.
A ferrugem asiática da soja, causa pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, é uma das doenças mais devastadoras para a leguminosa, com danos à produtividade que variam de 10% a 90%. Atualmente, o controle é feito com uso preventivo de vários fungicidas, combinando-se diferentes modos de ação. “A ferrugem é prioritária em novas pesquisas no mundo inteiro, mas mesmo que seja encontrado um produto mais eficaz para a ferrugem, ele só vai chegar ao mercado daqui a 16 anos, depois de passar por todos os testes e etapas de registro”, aponta Sant’Anna.
Veja abaixo a íntegra da nota de representantes da indústria de defensivos, de 26 de dezembro:
Em 20 de dezembro de 2017, a Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (ADAPAR) emitiu a Portaria 345, que autoriza, em caráter excepcional para a safra 2017/2018, a semeadura da soja até a data de 14 de janeiro de 2018, em todo o Estado do Paraná, para cultivos em sucessão às culturas de milho ou feijão.
Em razão da Portaria publicada, a Associação Nacional de Defesa Vegetal (ANDEF), o Comitê de Ação à Resistência de Fungicidas (FRAC-BR) e o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (SINDIVEG) manifestam que:
1) A redução do período de semeadura é medida de suma importância para redução do número de gerações do fungo Phakopsora pachyrhizi. Quanto maior for a janela de semeadura e número de gerações do fungo, maior será a pressão para o aparecimento de mutações nos sítios-de-ação dos fungicidas (DMI, QoI, SDHI) que ainda não foram detectados;
2) Além de forçar o fungo a buscar outros mecanismos de resistência como detoxificação, superprodução da enzima-alvo ou das bombas-de-efluxo, excreção do ingrediente-ativo e desenvolvimento de caminhos metabólicos alternativos;
3) Assim, sob o ponto de vista fitossanitário, a medida não é adequada pois aumenta o risco de resistência aos fungicidas, o que já vem sendo corroborado em diversas entrevistas de pesquisadores fitopatologistas publicadas na mídia;
4) A extensão do período de plantio sob o caráter de excepcionalidade, conforme mencionada na própria Portaria, refere-se à solução de um problema climático pontual para o estado do Paraná, não podendo, sob qualquer hipótese, ser extrapolada para situações em outros estados do país;
5) A ANDEF, o FRAC-BR e o SINDIVEG reforçam que, dada as dificuldades para pesquisa e aprovação de produtos fitossanitários à base de novos ingredientes ativos no Brasil, é de suma importância que a adoção de medidas que possam vir a afetar a sustentabilidade na Defesa Vegetal seja precedida por ampla discussão com pesquisadores especializados em resistência aos fungicidas;
6) Adicionalmente, as entidades signatárias também chamam a atenção para a necessidade futura de discussão sobre a relação benefício-custo do próprio cultivo da soja tardia em sucessão ao cultivo de milho ou feijão em face ao risco sanitário causado pela extensão do período de existência de plantas vivas de soja no campo em um período em que as condições climáticas favorecem as doenças e não favorecem o desenvolvimento da planta de soja.
O controle químico através do uso de fungicidas é a principal ferramenta de manejo da ferrugem da soja e essencial para a viabilidade da cultura no Brasil, porém não é a única. Assim sendo Boas Práticas Agrícolas, como o plantio de cultivares em épocas adequadas, calendarização de plantio adubação adequada, e outras práticas devem ser somadas a fim de garantir a sustentabilidade da cultura a longo prazo no nossopaís.
A ANDEF, o FRAC-BR e o SINDIVEG entendem que a manutenção da vida útil dos fungicidas só será possível com o respeito ao vazio sanitário e respeito às leis que estabelecem as datas limite de semeadura.
Fonte: gazetadopovo