106,5 FM
Rádio Costa Oeste
Gratidão. Esse é o sentimento que Maria Reni Hei, moradora
de Telêmaco Borba, nos Campos Gerais do Paraná, nutre pelo médico Márcio Paulo
de Lima. Ele mora em Curiúva, distante cerca de 50 quilômetros, e no período de
quase um ano fez diversas viagens aos domingos para atender gratuitamente a
filha da aposentada, que trabalha como diarista e conta que não podia pagar por
consultas.
Cerca de meio ano após a morte da paciente por uma doença no
estômago, o profissional pós-graduado em psiquiatria foi surpreendido com uma
carta de agradecimento, escrita à mão por Maria Reni.
“Dr. Márcio, estou agradecendo pelas consultas da minha
filha. O senhor está cumprindo o juramento que fez no dia da sua formatura, de
atender pessoas mesmo sem poder pagar. Deus lhe recompense. Só agora consegui
agradecer, pois o meu coração continua dolorido, mas Deus quis assim. Muito
obrigada, Deus te abençoe!”, diz a carta.
Ao g1, Maria Reni contou que enquanto vivia o luto recente,
sentia que precisava agradecer o médico pelo atendimento prestado.
"Eu sempre pensava em escrever uma carta, sempre tive
esse desejo no meu coração. O tempo foi passando, mas não estava em condições
emocionais. Quando consegui, escrevi chorando. Passou um filme na minha
cabeça", ressalta a mulher.
Para Márcio, receber o gesto foi "uma das coisas mais
lindas" que aconteceu na vida dele.
"Me marcou muito, me emocionou muito! Depois que eu
recebi a carta eu liguei pra ela e fiquei emocionado outra vez. Choramos
juntos, porque sinto a dor e a perda dela. Tudo que ela me disse ali, daquela
maneira tão singela - numa folha de papel e escrita de próprio punho, aquela
letrinha linda - é um marco na minha vida! Acho que não [apenas] na minha
carreira, mas na minha vida, como pessoa, como ser humano", avalia.
Patrícia, filha de Maria Reni, faleceu em abril de 2024. Aos
42 anos, foi vítima de infarto.
A mãe conta que a filha morreu enquanto aguardava por uma
cirurgia para tratar de uma hérnia de hiato, condição que provoca o
deslocamento do estômago e pela qual Patrícia foi diagnosticada havia cerca de
quatro anos.
Desde antes do surgimento da doença, a mulher enfrentava uma
depressão severa, que se intensificou com a morte do pai, seis anos antes.
Ela era acompanhada pela rede pública de saúde - mas como
Maria Reni não sentia melhora no estado psiquiátrico da filha e crises de surto
se agravavam cada vez mais, decidiu pedir conselhos na igreja que frequenta.
"As pessoas que me acompanhavam sabiam do meu
sofrimento e da minha luta. O pastor conversou com uma terapeuta que ele
conhecia e ela decidiu nos ajudar com o tratamento e relatou o caso ao Dr.
Márcio", conta a mulher.
Márcio Paulo de Lima atua como diretor do técnico Hospital
Municipal de Curiúva e possui um consultório particular.
Médico generalista pós-graduado em psiquiatria, ele conta
que tem como compromisso atender pacientes gratuitamente no próprio consultório
pelo menos um sábado por mês.
O ato é uma forma de gratidão por ter conseguido conquistar
o diploma da profissão em meio a adversidades, conta.
Ele possui 45 anos de idade e se formou em Medicina aos 38.
Antes, se graduou em Letras, foi professor da rede pública e trabalhou em um
banco. O interesse pela medicina surgiu quando assessorou um prefeito e teve
contato com a área da saúde, conta.
"Eu me propus que quando me formasse, depois que me
estabelecesse, se conseguisse constituir um nome e uma carreira e se tivesse
uma clínica/um local meu, que eu ia dedicar parte do meu tempo para atender
pessoas que não têm condições financeiras, como forma de agradecer a Deus. Já
fazem dois anos que eu faço isso", relata.
Quando soube da história de Patrícia e Maria Reni, decidiu
estender o atendimento gratuito para fora da própria clínica e resolveu se
deslocar até a cidade vizinha para ajudar a família.
"Eu me compadeci muito da história, das dificuldades da
mãe e da paciente. Elas estavam em sofrimento, eu via que os surtos não eram
uma situação natural. [...] Ela era depressiva, mas não tinha histórico de
psicose. [...] Era um caso que precisava de intervenção, e me deu muito prazer
ver a paciente evoluindo e a mãe sempre grata; aquela coisa sincera, verdadeira
mesmo", conta o médico.
Para Maria Reni, perder Patrícia foi um baque - mas escrever
a carta e rezar pelo bem do médico a faz sentir-se bem e honrar a própria
filha.
"Já perdi pai, mãe, esposo... mas filho é diferente; é
uma dor que não tem cura. Mas a gente tem que agradecer as pessoas que fazem o
bem pela gente", afirma.
Fonte: G1